18 de out. de 2010

sobre as coisas que fazemos sem nos dar conta

com os cabelos embaraçados, o coração com a tradicional batida forte e acelerada de poucas vezes e uma xícara de café na mão, ela pensa nele. é claro que o ele do escritor nunca é o ele do leitor... mas diga-se que seja... ele... é, ele.
- ele?
a noite já não era exclusiva dela e do maço de cigarros depositado ao canto da escrivaninha, que ela, inutilmente, tentava não alcançar. café forte era sinônimo de algo entre os dedos, algo para lhe lembrar de que a vida se esvai em uma tragada só, e de um jeito doloroso.
- porque não ficastes em Porto Alegre? Não era o que tu querias?
- acho que o que eu realmente queria não era Porto...
- e o que era?
fez-se silêncio por um momento, a resposta não chegava aos lábios dela nunca. tomou mais um gole do café. mudou o olhar, encarou os olhos cansados e então finalmente falou.
- o que tu queres com isso?
- eu? nada, já tu...
- não te entendo, não há motivo para o teu aparecimento...
- se assim tu achas.

ele esticou-se, pegou o maço, puxou um único cigarro, puxou do bolso um isqueiro verde-limão, parecido com o dela e acendeu o cigarro. ela sorriu para ele e olhou para o lado oposto, não fumaria.
- Porto Alegre te lembra a mim não né?
- lembra. lembra um tempo da minha vida também, dois na verdade.
- ambos bons?
- não. só um.
- não sei porque da tua relutancia, são coisas normais, tens que te adaptar. vai ser bom pra ti, tu sabes.
- não sei se será bom, não quero ter essa oportunidade...
- assim, sem aceitar é pior e tu sabes disso.
- pára de tentar me proteger, Dylan, eu sou tu, esse não é o teu papel.
- parei de te encomodar então.
e sumiu.
ela olhou para baixo, abriu as mãos e quase deixou cair o cigarro aceso por entre as pernas, assim, derrubou umas gotas de café quente em cima da coxa. não acreditava que havia realmente acendido o cigarro. olhou através da janela, uma paisagem de estrada... olhou para o relógio, duas horas da manhã. encostou a cabeça para o lado e adormeceu, abrindo os olhos apenas quando o ônibus fez uma curva acentuada, na entrada da rodoviária de Porto Alegre.

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