No final do ano passado, quando ajudava uma amiga a arrumar as malas para o estágio, brinquei de leitura de tarot pensando em ti. Nunca tinha feito e parti para uma das leituras mais complexas porque gostei da introdução. Depois de jogar as cartas nas suas posições fui ver o que tudo aquilo significava e não gostei das conexões que fiz. Não me lembro ao certo quais cartas e em quais posições mas sei que as cartas Apego ao passado e Consciência saíram. Fiquei com esse sentimento de que ainda haviam coisas que eu precisava trabalhar.
Antes de trocar o marca-passo, como sempre, trabalhei com a possibilidade de morrer e foi então que eu me lembrei dessa jogada de cartas. Ao longo desse ano tive muitos avanços e assumi que o assunto estava encerrado. Quando conversamos e eu me senti confortável de novo, na maior parte do tempo, pensei que, pelo menos, tinha aprendido a maior parte das lições. Agora, são duas pessoas completamente estranhas conversando porque quem eu conheci já não deve existir mais... e então pensando nisso resolvi jogar novamente as cartas, com o mesmo jogo e a mesma pessoa.
Abaixo trago a sequência de cartas e a interpretação de Osho para cada.
"Leitura Espelho
Esta leitura é utilizada para a percepção de assuntos relacionados com outra pessoa (amor, amizade, parentes, etc.); Ela revela cada indivíduo no seu processo de vida atual, assim como a maneira como se compõem as energias ou o efeito-parceria (seu relacionamento com a pessoa em questão).
Você no aqui/agora
1 - Sobre o Corpo: Carta Preguiça
Quando você está preguiçoso, o sabor é negativo: você simplesmente sente
que não tem energia, sente-se entediado; sente-se sonolento; você
simplesmente se sente morto.
Quando você está num estado de não-fazer, então, você está cheio de
energia - é um sabor muito positivo. Você tem energia total,
transbordante. Você se sente radiante, borbulhante, vibrante. Não há
sonolência, você está perfeitamente consciente. Você não está morto - você está tremendamente vivo...
Há certa possibilidade de que a mente o iluda: ela pode racionalizar a
preguiça como sendo não-fazer. Ela é capaz de dizer "Eu me tornei um
mestre Zen", ou "Eu acredito no Tao", mas você não estará enganando
ninguém. Apenas a você mesmo. Esteja alerta, portanto.
Comentário:
O cavalheiro desta figura claramente acha que já conquistou tudo.
Senta-se na sua grande poltrona estofada e macia, à sombra do seu
guarda-sol, com seus óculos escuros e seus chinelos cor-de-rosa,
segurando um coquetel refrescante. Não sente disposição para se levantar
e fazer algo, porque acha que já fez tudo. Ainda não se voltou para ver
o espelho que está se partindo à sua direita, um sinal seguro de que
essa posição que ele acha que finalmente galgou, está prestes a
desmoronar e dissolver-se diante dos seus próprios olhos.
A mensagem desta carta é de que esse recanto à beira da piscina não é o
seu destino final. A jornada não terminou ainda, como demonstra o
pássaro branco voando na vastidão do céu. Sua atitude autocomplacente
certamente decorre de um sentimento verdadeiro de realização, mas agora
já é hora de seguir em frente. Não importa quão confortáveis sejam os
chinelos, quão saboroso o seu coquetel: há ainda céus acima de céus
esperando por serem explorados.
2 - Sobre o Coração: Carta Possibilidades
A mente pode aceitar fronteiras em qualquer lugar. A verdade, porém, é
que, por sua própria natureza, a existência não pode aceitar fronteiras
de espécie alguma, pois... - o que haverá do outro lado do muro? Céu e
novamente um outro céu. Por isso é que estou dizendo que céus sobre céus
estão disponíveis para o seu voo.
Não se contente facilmente. Os que se contentam com pouco permanecem
pequenos: pequenas são as suas alegrias, pequenos são os seus êxtases,
pequenos são os seus silêncios, pequeno é o seu ser.
Mas não há necessidade disso!
Essa pequenez é uma imposição que você mesmo faz à sua liberdade, às
suas possibilidades ilimitadas, ao seu potencial sem limites.
Comentário:
A águia tem uma visão panorâmica de todas as possibilidades existentes
na paisagem lá embaixo, enquanto voa livremente pelo céu, com
naturalidade e sem qualquer esforço. Ela está realmente no seu domínio,
majestosa e senhora de si.
Esta carta indica que você se encontra num ponto em que um mundo de
possibilidades lhe é oferecido. Por ter desenvolvido mais amor para
consigo mesmo, por estar mais pleno de si mesmo, você consegue trabalhar
facilmente com os outros. Por estar relaxado e à vontade, você é capaz
de reconhecer possibilidades à medida que elas se apresentam, algumas
vezes até antes que outros as consigam perceber. Por estar em sintonia
com a sua própria natureza, você compreende que a existência lhe está
proporcionando exatamente aquilo de que você precisa. Aproveite o voo! E celebre todas as variadas maravilhas da paisagem aberta diante de seus olhos.
3 - Sobre a Mente: Carta Celebração
A vida é um momento para ser celebrado, desfrutado. Torne-a divertida,
uma celebração, e então você entrará no Templo. Esse templo não é para
os tristes e desanimados, nunca foi para eles. Olhe para a vida: você vê
tristeza em alguma parte? Você já viu uma árvore deprimida? Você já
encontrou um pássaro movido por ansiedade? Já viu um animal neurótico?
Não, a vida não é assim, absolutamente. Só o homem é que seguiu um
caminho errado, se desviou em algum lugar, porque ele se considera muito
sábio, muito esperto.
Sua esperteza é o seu mal. Não seja sábio demais. Lembre-se sempre de
parar; não vá a extremos. Um pouco de tolice e um pouco de sabedoria
fazem bem, e a combinação certa faz de você um buda...
Comentário:
Estas três mulheres dançando ao vento e na chuva, nos fazem lembrar de
que uma celebração nunca precisa ficar na dependência de circunstâncias
exteriores. Não é preciso esperar por um feriado especial ou por uma
ocasião formal, nem por um dia de sol sem nuvens. A verdadeira
celebração nasce de uma alegria que primeiro é experienciada
profundamente dentro do seu ser, e que se derrama num transbordamento de
canto e dança, de riso, e até mesmo de lágrimas de gratidão.
Quando você tira esta carta, é um sinal de que está se tornando cada vez
mais disponível e aberto às muitas oportunidades que existem para
celebrar na vida e contagiar outras pessoas. Não se preocupe em
programar uma festa na sua agenda. Deixe o cabelo ao natural, tire os
sapatos, e comece a pular nas poças d`água agora mesmo. A festa está
acontecendo à sua volta, a cada momento!
Pessoa no aqui/agora
4 - Sobre o Corpo: Carta Indo com a Correnteza
Quando eu digo "transforme-se em água", quero dizer "transforme-se num
fluxo" - não fique estagnado. Mova-se, e mova-se como a água. Lao Tsé diz: A maneira de ser do Tao é igual à de um curso d`água.
Movimenta-se como a água. E como é o movimento da água? Ou um rio? Esse
movimento tem algumas coisas belas em si. Uma delas é que a água se
desloca sempre em direção à profundeza, sempre procura o terreno mais
baixo. A água não tem ambição, nunca briga por ser a primeira: ela quer
ser a última. Lembre-se de que Jesus disse: "Os últimos serão os primeiros no meu
reino de Deus". Ele estava falando sobre essa maneira de ser do rio, do
Tao - sem mencioná-la, mas falando a respeito dela. Quanto a você, seja
o último, seja sem ambição. Ambição significa subir morro acima. A água
vai para baixo, procura o terreno mais baixo, quer ser uma
não-entidade. Não quer proclamar-se especial, excepcional,
extraordinária. A água não tem qualquer noção de ego.
Comentário:
A figura desta carta está completamente relaxada e à vontade na água, deixando a correnteza levá-la aonde queira. É alguém que dominou a arte de ser passivo e receptivo, sem sentir-se enfadado ou sonolento. Apenas está disponível ao rio da vida, sem ter nunca um pensamento do tipo "Eu não gosto disto aqui", ou "Eu prefiro ir em outra direção".
A cada momento na vida temos a opção de entrar na correnteza e boiar, ou
de tentar nadar rio acima. Quando esta carta aparece em uma leitura, é
uma indicação de que agora você está preparado para flutuar, confiante
em que a vida o apoiará no seu relaxamento, e irá levá-lo exatamente
aonde ela quer que você vá. Deixe que esse sentimento de confiança e
relaxamento cresça cada vez mais; tudo está acontecendo exatamente como
deveria.
5 - Sobre o Coração: Carta Abundância
No Oriente, as pessoas condenaram o corpo, condenaram a matéria,
chamaram-na de "ilusória", de maya: coisa que de fato não existe, apenas
parece existir; coisa feita da mesma substância dos sonhos. As pessoas
renegaram o mundo, e esta é a razão pela qual o Oriente permaneceu
pobre, doente, faminto.
Metade da humanidade tem vivido aceitando o mundo interior, mas negando o
mundo exterior. A outra metade tem aceitado o mundo material, e negado o
mundo interior. Ambas são metades, e homem nenhum que seja uma metade
pode estar satisfeito.
É necessário ser inteiro: rico no corpo, rico em ciência; rico em meditação, rico em consciência. No meu modo de ver, apenas a pessoa inteira é uma pessoa sagrada.
Eu quero que se misturem Zorba e Buda. Zorba sozinho é vazio. Sua dança
não tem significação eterna, é prazer momentâneo. Logo ele se cansará
dela. A menos que você disponha de fontes inesgotáveis que lhe venham do
próprio cosmos... a menos que você se torne existencial, não poderá
tornar-se inteiro.
Esta é a minha contribuição para a humanidade: a pessoa inteira.
Comentário:
Este tipo dionisíaco é o próprio retrato de um homem inteiro, um "Zorba e
Buda" que pode beber vinho, dançar na praia, cantar na chuva, e ao
mesmo tempo desfrutar as profundezas da compreensão e do conhecimento
próprios do sábio. Em uma das mãos ele segura uma flor de lótus,
demonstrando que respeita e contém em si mesmo a graça do feminino. O
peito exposto (um coração aberto) e a barriga relaxada mostram que ele
está à vontade com a sua masculinidade também, inteiramente pleno de si.
Os quatro elementos; terra, fogo, água e céu, confluem no Rei do
Arco-Íris, que está sentado sobre o livro da sabedoria da vida.
Se você é mulher, o Rei do Arco-Íris traz para a sua vida o apoio de
suas energias masculinas, uma união com a alma gêmea interior. Para um
homem, esta carta representa uma oportunidade para romper com os
estereótipos masculinos convencionais, permitindo que transpareça a
plenitude do ser humano.
6 - Sobre a Mente: Carta Política
Qualquer um que seja capaz de fingir com convicção, que consiga ser
hipócrita, se tornará seu líder político, se tornará seu sacerdote
religiosamente. Tudo que ele precisa é de hipocrisia, tudo o que ele
precisa é de dissimulação, tudo que ele precisa é de uma "fachada" para
se esconder por trás. Os seus políticos vivem vidas duplas, os seus
sacerdotes levam vida dupla - uma pela porta da frente, a outra pela
porta dos fundos. E aquela vivida pela porta dos fundos é a vida real
deles. Aqueles sorrisos pela porta da frente são pura falsidade, aquelas
caras tão inocentes são puramente cultivadas. Se você quiser ver a realidade do político, precisará olhá-lo pela porta
dos fundos. Deste ângulo ele aparece na sua nudez, do jeito como ele é;
e para o sacerdote a coisa é assim também. Esses dois tipos de pessoas
dissimuladas têm dominado a humanidade. Muito cedo eles descobriram que,
se você quer dominar a humanidade, deve torná-la fraca, fazê-la
sentir-se culpada, não-merecedora. Destrua a sua dignidade, tire-lhe
toda a glória, humilhe-a. E encontraram maneiras tão sutis de humilhar,
que eles nem aparecem "na foto"; você mesmo fica encarregado de se
humilhar, de se destruir. Eles lhe ensinaram uma forma de suicídio
lento.
Comentário:
Você reconhece este homem? Com exceção dos mais inocentes e sinceros de
nós, todos temos um político de tocaia em algum lugar da nossa mente. De
fato, a mente é política. É da sua própria natureza planejar, montar
esquemas, e tentar manipular situações e pessoas de maneira a conseguir o
que quer. Nesta carta, a mente é representada pela serpente recoberta
de nuvens, que "fala com uma língua bífida". O que é importante
perceber, porém, a propósito desta figura, é que ambas as caras são
falsas. A face cândida, inocente, do tipo "confie em mim", é uma
máscara, e a face diabólica, venenosa, do tipo "vou tirar vantagem de
você", também não passa de uma máscara.
Políticos não têm faces verdadeiras. Seu jogo é na totalidade uma mentira.
Dê uma boa examinada em si mesmo para verificar se você tem estado
fazendo esse jogo. O que você vai encontrar poderá ser doloroso de ver,
mas não tão doloroso quanto continuar agindo igual. No final, esse jogo
não serve ao interesse de ninguém, e muito menos ao seu. O que quer que
você consiga por esse caminho, irá transformar-se em pó nas suas mãos.
Manifestação exterior da parceria
7 - Sobre a dissolução e fusão (intimidade): Carta Projeções
Numa sala de cinema, você olha para a tela, nunca para o fundo da sala
- o projetor está no fundo. O filme de fato não está na tela: é apenas
uma projeção de sombra e luz. O filme existe apenas lá atrás, mas você
nunca olha naquela direção. E o projetor está lá. Sua mente está por trás da coisa toda: a mente é o projetor. Mas você
fica sempre olhando para o outro, porque o outro é a tela.
Quando você está apaixonado, a pessoa parece linda, incomparável. Quando
você sente ódio, a mesma pessoa parece a mais feia de todas, e você
nunca se questiona como pode a mesma pessoa ser a mais feia e a mais
bonita...
A única maneira, portanto, de se chegar à verdade, é aprender como
enxergar diretamente, como deixar de lado a intermediação da mente. Essa
interferência é o problema, porque a mente só é capaz de criar
sonhos...
Com a ajuda do seu entusiasmo, o sonho começa a parecer
realidade. Quando o entusiasmo é demasiado, então você está intoxicado,
não está na posse dos seus sentidos. Nessa condição, o que quer que você
enxergue será apenas uma projeção sua. E existem tantos mundos quanto
mentes, porque cada mente vive no seu próprio mundo.
Comentário:
O Homem e a mulher desta carta estão se olhando; contudo, não são capazes de se enxergar com nitidez. Cada qual está projetando uma imagem que construiu em sua mente, de maneira a encobrir o rosto verdadeiro da pessoa para quem está olhando.
8 - Sobre a Alquimia do companheirismo (transformação): Carta Culpa
Este momento!... O aqui-agora... fica esquecido quando você começa a
pensar em termos de conquistar alguma coisa. Quando a mente realizadora
se manifesta, você perde contato com o paraíso em que está. Esta é uma
das abordagens mais liberadoras: ela o liberta imediatamente! Esqueça tudo a respeito do pecado e da santidade - ambas são ideias
estúpidas. Juntas, destruíram todas as alegrias da humanidade. O pecador
se sente culpado, e com isso sua alegria fica perdida. Como é possível apreciar a vida se você está sempre se sentindo culpado?
Se o tempo todo você fica indo à igreja para confessar que fez isto e
aquilo errado? Errado, errado, errado... a sua vida inteira parece ser
feita de pecados. Como viver com alegria? Fica impossível sentir prazer
na vida. Você se torna pesado, carregado. A culpa instala-se no seu
peito como uma pedra - ela o esmaga; não permite que você dance. Como
seria possível dançar? Como a culpa pode dançar? Como a culpa pode
cantar? Como a culpa pode amar? Como a culpa pode viver? Assim, quem
pensa que está fazendo coisas erradas sente-se culpado, pesado, um morto
antes da hora - já está dentro do túmulo.
Comentário:
A culpa é uma das emoções mais destrutivas em que podemos nos deixar aprisionar. Se tivermos agido mal com alguém, ou procedido contrariamente à nossa própria verdade, naturalmente nos sentiremos mal. Mas permitir que fiquemos sobrecarregados de culpa é fazer um convite à
enxaqueca. Acabaremos envolvidos por nuvens perturbadoras de dúvidas a
nosso próprio respeito, e por sentimentos de desvalor, a ponto de não
conseguirmos enxergar as belezas e alegrias que a vida está tentando nos
oferecer.
Todo mundo anseia por ser uma pessoa melhor - mais amorosa, mais
consciente, mais sincera consigo mesmo. Quando, porém, nos punimos por
nossas falhas, sentindo-nos culpados, podemos cair prisioneiros de um
ciclo de desespero e desesperança que nos tira toda a clareza de visão a
nosso próprio respeito e a respeito das situações que encontramos pela
frente. Você é absolutamente bom do jeito que é, e é absolutamente
natural errar o caminho de vez em quando. Apenas aprenda com a
experiência; siga em frente e aproveite a lição para não cometer o mesmo
erro outra vez.
9 - Sobre as Bênçãos (benefícios e dádivas): Carta Sofrimento
Esta dor que o aflige não deve deixá-lo triste, lembre-se disso. É este o
ponto que as pessoas continuam a não compreender... Esta dor é apenas
para deixá-lo mais alerta - porque as pessoas só ficam atentas quando a
seta vai fundo no seu coração e as fere. De outra maneira, não
despertam. Quando a vida é fácil, confortável, conveniente, quem se
preocupa? Quem se dá ao trabalho de ficar alerta? Quando morre um amigo,
apresenta-se uma possibilidade. Quando a sua mulher o abandona -
naquelas noites escuras, você sente solidão. Você amou tanto aquela
mulher e arriscou tudo por ela e, então, de repente, um dia, ela vai-se
embora. Chorando na sua solidão... essas são as ocasiões em que, sabendo
aproveitá-las, você poderá tornar-se consciente. A seta está ferindo:
então é possível usá-la.
A dor não existe para fazê-lo infeliz: ela está
aí para torná-lo mais consciente! E quando você se torna consciente, a
infelicidade desaparece.
Comentário:
Esta figura é de Ananda, primo e discípulo do Buda Gautama. Ele esteve ao lado do Buda constantemente, cuidando de cada necessidade dele por quarenta e dois anos. Quando Buda morreu, conta-se que Ananda estava ainda a seu lado, chorando. Os outros discípulos repreenderam-no por ele não estar entendendo: Buda havia morrido completamente realizado; Ananda deveria estar celebrando! Mas Ananda respondeu: "Vocês é que não estão compreendendo. Não estou chorando por ele, mas por mim mesmo, porque ao longo desses anos todos eu estive constantemente ao seu lado, e mesmo assim não consegui atingir". Ananda ficou acordado a noite inteira, meditando profundamente e sentindo sua dor, sua tristeza. Diz a história que, quando o dia amanheceu, ele estava iluminado.
Esta figura é de Ananda, primo e discípulo do Buda Gautama. Ele esteve ao lado do Buda constantemente, cuidando de cada necessidade dele por quarenta e dois anos. Quando Buda morreu, conta-se que Ananda estava ainda a seu lado, chorando. Os outros discípulos repreenderam-no por ele não estar entendendo: Buda havia morrido completamente realizado; Ananda deveria estar celebrando! Mas Ananda respondeu: "Vocês é que não estão compreendendo. Não estou chorando por ele, mas por mim mesmo, porque ao longo desses anos todos eu estive constantemente ao seu lado, e mesmo assim não consegui atingir". Ananda ficou acordado a noite inteira, meditando profundamente e sentindo sua dor, sua tristeza. Diz a história que, quando o dia amanheceu, ele estava iluminado.
Tempos de grande sofrimento trazem em si, potencialmente, tempos de
grande transformação. Para que a transformação aconteça, porém,
precisamos ir fundo às raízes da nossa dor, vivenciando a dor exatamente
como ela é, sem culpa e sem autopiedade.
Propósito espiritual interior
10 - Sobre a dissolução e fusão (intimidade): Carta Além da Ilusão
Esta é a única distinção entre o sonho e o real: a realidade permite-lhe duvidar e o sonho não lhe permite duvidar...
Para mim, a capacidade de duvidar é uma das maiores bênçãos da
humanidade. As religiões comportam-se como inimigas, porque podam as
próprias raízes da dúvida; e existe uma razão para que elas ajam assim:
elas querem que as pessoas acreditem em determinadas ilusões que elas
vivem pregando...
Por que motivo pessoas como o Buda Gautama têm insistido tanto em que a
existência inteira - com exceção do seu eu que a tudo testemunha, com
exceção da sua consciência - é efêmera, feita do mesmo material de que
são feitos os sonhos? Elas não estão afirmando que aquelas árvores não
se encontram ali. Não estão dizendo que aqueles pilares não estão lá.
Não entenda mal por causa da palavra 'ilusão' (maya)... A palavra foi traduzida como "ilusão", mas 'ilusão' não é a palavra
certa. Ilusão é algo que não existe. A realidade existe. "Maya" fica
exatamente entre as duas - algo que quase-existe. No que diz respeito a
atividades do dia-a-dia, maya pode ser tomado como realidade. Apenas no
seu sentido máximo - a partir do ápice da sua iluminação -, as coisas
se revelam irreais, ilusórias.
A borboleta, nesta carta, representa o exterior, aquilo que está
constantemente se transformando, aquilo que não é real, mas uma ilusão.
Por detrás da borboleta está a face da consciência, olhando para dentro,
para aquilo que é eterno. O espaço entre os dois olhos abriu-se,
revelando o lótus do desenvolvimento espiritual e o sol da consciência
que se levanta. Através da ascensão do sol interior, nasce a meditação.
A carta nos lembra de não olhar para fora à procura do que é real, mas
olhar antes para dentro de nós mesmos. Quando nos concentramos no mundo
exterior, com frequência nos assaltam os julgamentos - isto é bom, isto
é ruim, isto eu quero, aquilo eu não quero. Tais julgamentos nos mantêm
prisioneiros das nossas ilusões, da nossa sonolência, dos nossos velhos
hábitos e padrões. Abandone sua mente opiniosa e mova-se para dentro. Lá você poderá
relaxar no seio da sua própria verdade mais profunda, onde a diferença
entre sonhos e realidade já é.
11 - Sobre a Alquimia do companheirismo (transformação): Carta Repressão
Em sânscrito, a palavra é "alaya vigyan": a casa em cujo porão você vai
juntando coisas que gostaria de fazer, mas que não pode por causa das
condições sociais, da cultura, da civilização. Essas coisas, porém, vão
se acumulando ali, e muito indiretamente passam a afetar as suas ações, a
sua vida. Elas não podem encará-lo diretamente - você as obrigou a
ficar na escuridão; mas, do escuro, elas continuam influenciando o seu
comportamento. Elas são perigosas: é arriscado manter todas essas
inibições dentro de você.
É possível que essas sejam as coisas que atingem um clímax, quando uma
pessoa enlouquece. A loucura não é outra coisa senão todas essas
repressões chegando a um ponto em que você já não consegue controlá-las.
A loucura, porém, é aceitável, ao passo que a meditação não - e a
meditação é o único caminho para tornar uma pessoa absolutamente sã.
Comentário:
A figura desta carta apresenta-se literalmente "emaranhada em nós". Sua luz ainda brilha no íntimo, mas esse personagem reprimiu sua própria vitalidade na tentativa de corresponder a muitas exigências e expectativas. Abriu mão de todo o seu próprio poder e visão, em troca de
ser aceito por essas mesmas forças que o aprisionaram. O perigo de
reprimir dessa maneira a própria energia natural é visível nas
rachaduras de uma erupção vulcânica que está para acontecer em toda a
volta da figura.
A verdadeira mensagem desta carta é que é necessário encontrar uma saída
de cura para essa explosão iminente. É essencial encontrar uma maneira
de dar vazão a qualquer tensão e estresse que possam estar se
acumulando, neste momento, dentro de você. Soque um travesseiro, dê
pulos, procure uma área deserta e berre contra o céu vazio: qualquer
coisa que possa ativar sua energia e consiga fazê-la circular
livremente. Não espere que aconteça uma catástrofe.
12 - Sobre as Bênçãos (benefícios e dádivas): Carta A Mente
Esta é a situação da sua cabeça: vejo ali guidões de bicicleta, pedais e
coisas estranhas que você foi juntando de toda parte. Uma cabeça tão
pequena… e sem espaço para se viver nela! E esse material inútil fica
revolvendo-se em sua cabeça; sua cabeça fica girando e tramando - e isso
mantém você ocupado. Imagine só que tipos de pensamentos vão passando
pela sua mente…
Qualquer dia, simplesmente sente-se, feche os olhos, e coloque no
papel, durante meia hora, o que quer que passe pela sua mente. Você
compreenderá o que estou querendo dizer, e ficará surpreso com o que
transita no interior da sua mente. Isso tudo vai ficando nos bastidores,
fica ali o tempo todo, e acaba envolvendo-o, como uma nuvem. Devido a
essa nuvem, você não consegue distinguir a realidade, não consegue
chegar à percepção espiritual. É preciso desfazer-se dela. E apenas com a
sua decisão de descartá-la é que ela irá desaparecer. Você está apegado
a ela, a nuvem mesma não tem o menor interesse em você, lembre-se
disso.”
Isto é o que acontece quando nos esquecemos de que a mente foi feita
para servir, e começamos a permitir que ela dirija a nossa vida. A
cabeça está cheia de mecanismos, a boca não pára de censurar, e toda a
atmosfera em volta fica poluída por essa fábrica de argumentos e de
opiniões. “Mas, espere aí!”, você talvez diga. “A mente é o que nos
torna humanos, é a fonte de todo progresso, de todas as
grandes verdades!” Se você acredita nisso, faça uma experiência: entre
no seu quarto, feche a porta, ligue um gravador, e passe a falar sem
restrições o que quer que lhe venha “à mente”. Se de fato você deixar
que saia tudo, sem nenhuma censura ou retificação, ficará espantado de
ver a quantidade de tolices que você dirá.
O Valete das Nuvens está lhe
dizendo que alguém, em algum lugar, está preso em uma “viagem da
cabeça”. Dê uma olhada, e assegure-se de que não é você."
Tarot Zen, de Osho
17/12/2018 15h